quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Sentença desperdiçada: Direito de resposta

Quando a gente já foi professora, guarda algumas manias. Uma das minhas é não aceitar qualquer resposta, conferir se as respostas correspondem exatamente ao que foi perguntado. No dia a dia, muitas perguntas começadas com "para que?", são respondidas com "porque", o que não é a mesma coisa.
No campo da política, a coisa fica mais séria. A qualquer pergunta que se faça a um candidato espertinho, raramente ele vai responder com uma resposta direta sobre o assunto perguntado. Vai no mínimo fazer umas voltas pelos assuntos que a ele interessa propagar. Você pergunta pedra, ele responde queijo. É esperteza de quem precisa aproveitar todas as oportunidades para divulgar suas idéias, passar uma boa imagem, conquistar adeptos. Não é muito honesto, mas é explicável. Principalmente na campanha eleitoral, quando cada minuto é precioso, a disputa por votos é acirrada.
Mas o tiro pode sair pela culatra, a esperteza pode produzir estragos na imagem, quando o desvio não é apenas um recurso de marketing ... Vejam esta:


Quando peguei a VEJA desta semana e li comentários de leitores sobre o “direito de resposta” pedido à Justiça Eleitoral e concedido ao PT, por causa da divulgação de matéria considerada ofensiva ao partido – eu fui procurar os números anteriores para ver do que se tratava.

Por mais que me esforce não consigo entender. Gostaria de dizer que não sei o que se passa na cabeça dos políticos. Mas para minha tristeza, acho que eles querem mesmo é nos confundir, fazer uma tempestade em copo d’água, não explicar nada e fazer-se de vítimas, para enganar os ignorantes, os ingênuos, os distraídos. Eles sabem muito bem que a maioria das pessoas lê superficialmente, analisa pouco.


Vamos aos fatos: resumindo, o candidato a vice-presidente na chapa do Serra disse que o PT está ligado às FARC e, portanto, ao narcotráfico. Uma acusação já bem velha, sem novidades. A revista VEJA, achando que o assunto ainda dava bom caldo, apresentou na edição de 28 de julho, uma reportagem, levantando todos os casos já conhecidos e divulgados que serviam para ilustrar a tal acusação do deputado Antônio Pedro Índio da Costa. Pelo tratamento da matéria, percebe-se nitidamente que a revista tem uma posição sobre o assunto, que não aprova, que recrimina, que considera esses fatos desabonadores para um partido político, sob o império democrático da Lei. Direito dela, como órgão da imprensa livre. Uma revista não é apenas noticiosa. Pode ser opinativa. Ninguém é obrigado a concordar. Por isto precisamos ler várias fontes.


O PT, julgando-se ofendido, pediu e obteve direito de resposta. Na votação, de 4 a 3, venceu o Direito de resposta. A argumentação no voto de cada juiz, bem esclarecedora, mostra que eles estudaram bem o caso, trabalho sério, ainda que com opiniões conflitantes. Ora, de sentença da Justiça, pode-se até discordar, mas só resta obedecer. Então, a revista cedeu uma página inteira da edição de 11.08.2010, para a resposta do ofendido.


Aí é que eu fiquei estarrecida. Para mim, na minha ingênua ignorância, a resposta seria uma oportunidade de refutar as acusações, apresentar argumentação e provas em contrário, desmascarar as mentiras. Seria a hora de esclarecer os fatos, mostrar que foram distorcidos, dar nova versão ou justificativa para as relações suspeitas apontadas pela revista, expor evidências de inocência, ou, se for o caso, mostrar que o erro já foi corrigido, os culpados alijados do partido, os arrependidos aceitos após severa punição, sei lá o que mais...


Mas não! Lá está a resposta, centralizada numa página vazia, onde caberia muito mais informação relevante. E ela não diz nada. Só lamúrias. É vergonhoso de tão genérico e vazio. Diz que o partido é santo, respeita as leis, pauta-se pela Constituição, tem uma história de luta pela justiça, abomina o narcotráfico etc etc etc. Mas, e os fatos? E quanto às acusações apontadas na reportagem, os fatos narrados, nada a declarar? Basta dizer que são inverdades e pronto? Se não se vai esclarecer nada, para que o direito de resposta?
Que fique bem claro que esse meu comentário não é sobre o conteúdo das acusações, que não trazem novidades. Apenas estou comentando o vazio da resposta, um truque para substituir a lógica pela conversa fiada, posar de vítima e comover os mal informados.


Foi inútil a sentença do TSE. As acusações consideradas tão ofensivas continuam sem resposta.


(Em tempo: vale a pena refletir sobre as três perguntas apresentadas pela revista Veja, no canto direito superior da página 81 da edição de 18.08.2010. Muito a pensar sobre a tal liberdade de imprensa em tempos de eleição)

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