sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Nasce um bairro moderninho

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Corriam os anos 50.

O Colégio Sion dava vida ao bairro. Os ônibus especiais e os carros particulares iam e vinham, levando e trazendo as alunas e os professores, nos horários das aulas. Havia pouco movimento nas ruas. Por isto, era o maior sucesso quando surgia algum carro com um ou mais rapazes, para ver as meninas que saíam ou chegavam, ou para acompanhar o ônibus em seu trajeto. Afinal, ali era um fim de mundo, não era passagem para lugar nenhum. Quem ali chegava, só podia ser por causa do colégio...

Com a “discrição” própria da idade, as adolescentes mais ligadinhas logo apontavam, com cochichos e risinhos, a colega que seria alvo das atenções dos visitantes. No fundo, todas queriam ser, mas não confessavam. Na verdade, na época eram raros os admiradores que pudessem dispor de um carro para suas aventuras. Todos muito jovens ou de famílias em que apenas os pais dirigiam carros.

A propósito, naquele tempo, aqui, poucas mulheres eram motoristas. A primeira mãe que apareceu no colégio, dirigindo o carro da família para conduzir suas filhas, foi Dona Aurora, uma senhora fina e elegante viúva de Waldomiro Magalhães Pinto (fundador do Banco Nacional, irmão do poderoso banqueiro que viria a ser governador de Minas e senador da República). Ela dirigia seu carro com naturalidade e competência, como era já costume em centros menos acanhados do que Belo Horizonte.

Bem que meu pai dizia que era preciso viajar sempre, tomar um “banho de civilização”, para ampliar horizontes e ter a mente aberta para costumes diferentes. Essa postura vanguardista do maridão fez com que minha mãe também se tornasse exímia “chauffeuse”, como se dizia. Uma iniciativa muito prática, que deu agilidade à turma lá de casa e aproveitamento máximo ao carro que, anteriormente, passava o dia inteiro debaixo das árvores da Avenida Afonso Pena, enquanto papai trabalhava no centro da cidade. Assim, mamãe não precisava mais sair a pé ou tomar bonde e ônibus para fazer compras e outros afazeres. Minhas colegas ainda hoje lembram dela, linda e jovem senhora de cabelos grisalhos, sempre sorridente na direção do Chevrolet. Nós não tínhamos sofisticação suficiente para manter um motorista profissional...

Com o prolongamento da rua Grão Mogol e com o calçamento das ruas, o bairro Sion preparou sua explosão demográfica dos anos 60 e passou a ser um sucesso imobiliário. Casas novas, modernas, com suave colorido como se usava, esbanjavam revestimentos de pastilhas, coberturas sem telhado aparente e largas fachadas de vidro. Entre caminhos de pedra ouro preto, touceiras de folhagens verdejantes tentavam reproduzir em escala doméstica, mas com singela elegância, o paisagismo de Burle Marx, abandonando a tradição dos canteiros floridos e das trepadeiras nas varandas, marcas dos jardins de minha infância. Belo Horizonte se modernizava no bairro Sion. A arquitetura moderna deixa seu berço na Pampulha e, ali, é apropriada por jovens casais de uma emergente classe média alta, com bom gosto e interesse por qualidade de vida.

Enquanto o bairro se formava, crescia também a população pobre do Morro do Papagaio que, atraída pelo novo mercado de trabalho – principalmente serviços domésticos e construção civil - ia ocupando a encosta e mudando as características da antiga comunidade local.

Nessa fase da vida do bairro, eu me formei professora. Iludida e idealista, mas aplicadíssima. Sonhando em me casar e morar numa daquelas casas novas que surgiam nas ruas Grão Mogol, Chicago, Washington, Montevidéu. Sonhos não custam caro. Casas, sim.





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