Acabo de me instalar, feliz da vida, no novo apartamento, nas
alturas do décimo primeiro andar. Cheguei com o inverno e assim vou vivendo a bela primavera de Belo Horizonte.
De cada lado do prédio, uma vista que me encanta.
Olhando
pela ampla janela da frente, vejo os contornos da Serra do Curral, emoldurando tudo,
desde o bairro da Serra até o limite do Belvedere.É atrás dessa montanha que nasce a lua cheia, aquela que me recebeu nas primeiras noites que passei aqui, neste novo pouso.
Da sala de jantar, outra janela,
de onde se descortina a cidade - o centro de Beagá - um mar de edifícios com o horizonte
lá longe, sumindo na bruma seca do fim do inverno.
Sentada
à minha mesa de trabalho, fico diante de uma das mais eloquentes constatações
da passagem do tempo em minha vida: a volumosa massa de prédios modernos que
brotaram da terra com o crescimento do bairro Sion. Nada disso existia quando eu era jovem e via
essas ruas serem abertas, as primeiras casas construídas, o bairro ganhar vida
própria. Lá, ao fundo, as casinhas do Morro do Papagaio, em alvenaria sem reboco, também muito
diferentes dos casebres da favela nos idos de 1950.
A marca registrada do bairro são
os nomes de suas ruas e praças, misturando países, cidades e estados das
Américas, a maior miscelânea. As duas primeiras ruas no mapa, aqui ao norte do
bairro Sion, são Canadá e Paraguai, ruas de um só quarteirão, que vão da Rua Cristina (uma cidade mineira), no bairro do Carmo, até a Flórida! Aí começa a República
Argentina que atravessa Uruguai, Buenos Aires e Montevidéu, Nova York,
Washington, Chicago e La Plata, passa perto da Terra Nova, sem a menor
preocupação com a geografia. O mesmo acontece com a Califórnia que começa na Uruguai, passa por essas ruas já citadas, acrescentando as Antilhas, e acaba na Praça
Alasca! Santiago liga Chile à República Argentina. Aí também estão Valparaíso, Venezuela,
Colômbia, Estados Unidos, Peru, Nicarágua, Assunção, Panamá, Costa Rica, Guianas,
Santa Fé, Groelândia. A divisa sul do bairro, confinando com o Belvedere, é traçada pelas ruas Patagônia e Haiti. Existem algumas ruas cujos nomes
fogem ao anárquico padrão que orientou a seleção de topônimos americanos para
nossas ruas: São João do Paraíso, do sul de Minas, Guaratinga da Bahia e Turibaté
que nem o Google sabe o que é – o que fazem esses três nomes em ruas situadas bem
no miolo do bairro? Já Santa Maria de Itabira, Pains, São João da Ponte, Rubim e Mantena, ficando pra lá da Avenida Uruguai, é como se não tivessem sido programadas para pertencer ao bairro. Realmente, a configuração atual dessa região dá a entender que o plano original foi um pouco deslocado durante o processo de urbanização.E não é só isso: Bolívia, Equador, Caiena,
Iucatan, Maldonado e Mendonça, certamente integrantes do projeto do Sion,
agora estão mais para o bairro São Pedro, porque ficam do outro lado da Avenida
Nossa Senhora do Carmo, uma evidência de que essa avenida não fazia parte do plano urbanístico original do bairro. (ver um pouco dessa história na postagem do dia 5
de janeiro de 2012) Planejar é preciso, mas a realidade sempre vence os planos.
A coisa mais linda que existe por aqui - desde quando ainda não havia nem ruas nem praças - e fica cada vez mais sensacional, é o ipê amarelo da Praça Nova York. Ao construírem a praça, o ipê, espécie da vegetação nativa, foi preservado, motivo pelo qual ele fica meio deslocado, entre o canteiro e a calçada que circunda a área central. À sua sombra já brincaram algumas gerações - pelo menos as de meus filhos quando crianças e depois meus netos. A árvore majetosa domina a praça e a recobre de amarelo quando suas flores de ouro são espalhadas pelo vento. Sábado passado, muita gente estava lá tirando fotos. Este bairro é muito legal!